quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Precisava escrever, exteriorizar o caos interior. A escrita a faz se encontrar (ou por vezes se perder), a liberta afinal. Escrever aquilo que não consegue falar com palavras ditas, pois da sua boca saem apenas palavras mudas.

Algumas pessoas escrevem aquilo que não conseguem falar. Mas naquele momento as palavras lhe pareciam ter sumido.

E essa ausência de palavras dava a ela a sensação de estar completamente perdida, como se não visse, não ouvisse, não falasse, não sentisse, apenas sobrevivesse.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Hoje o dia amanheceu sem cor

"As vezes tudo fica meio estranho. Você fica impaciente e acaba catando formigas no formigueiro. Você enfia sua mão lá dentro mesmo sabendo que vai ser picado e que isso vai doer.Algumas pessoas tem essa resistência maior a dor física, as vezes isso passa pro emocional e a única coisa que machuca, e quando machuca, é não saber bem o que sentir.
Trocaram os móveis de lugar. Toda vez que isso acontece alguma coisa aqui dentro também muda.Já estive nessa mesma posição antes. Com esse mesmo olhar. Depois de um longo processo de reflexão, buscas e conquistas eu volto sempre pro mesmo lugar. Resolvi ficar de vez. Esse mundo grande e mágico que meus olhos buscam não foi feito pra mim. Hoje o dia amanheceu sem cor e nem sei bem se a gente deve colorir."

(Gabriela Oliveira)

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

"Uma dor profunda envolvia o seu coração. Sentia-se enfraquecida e de alguma forma carente." 

 

 

Dr.Brian Weiss

domingo, 12 de dezembro de 2010

O Ciclo

"Mágoa. [...] Está para lá da tristeza, da solidão, do desejo de lutar pelo que já se perdeu, da raiva de não ter o que mais se queria, da pena de ter deixado fugir um grande amor, por ser demasiado grande.
Primeiro grita-se, barafusta-se, soluça-se em catadupas, fazem-se esperas, mandam-se flores, livros sublinhados, convocam-se os amigos para em quórum planearem connosco uma estratégia de recuperação, sente-se aos solavancos e come-se sem mastigar, num torpor raivoso e revoltado. A vida vai mais depressa do que nós, passa-nos por cima e os dias comem-se uns aos outros. Só queremos que o tempo corra para nos apaziguar a dor e acalmar os papos nos olhos.
Depois é o pós-guerra, a rendição, a entrega das armas e as sentenças de um tribunal marcial interior, em que os juízes são a vida e o réu, o que fizemos dela.
Limpam-se os destroços, enterram-se os mortos, tratam-se os feridos que são as nossas feridas, feitas de saudades, desencontros, palavras infelizes e atitudes insensatas, medos, frustrações e tudo o que não dissemos. Há quem se rodeie de amigos, durma com antigos casos, se enrole numa manta de xadrez e se torne o mais fiel cliente do clube de vídeo da esquina. Há quem tome calmantes, absorva vodka em noitadas vazias como uma esponja inútil, se mude outra vez para casa da mãe, ou parta em uma viagem para um local turisticamente muito apetecível.
O pior é quando se chega lá, apetece tudo menos lá ficar. Percebemos que não há longe nem distância para a dor, e que nenhum amante, amigo, mãe, irmão, droga ou bebida matam a saudade do que já fomos ou de quem já tivemos nos braços.
A mágoa chega então, quando o cansaço já não nos deixa sentir mais nada. É silenciosa e matreira, instala-se sem darmos por ela, aloja-se no coração e começa a deixar sinais aqui e ali, dentro de nós. A pouco e pouco sentimos que já não somos a mesma pessoa.
As cicatrizes podem esbater-se com os anos e ser remendadas com hábeis golpes de plástica, mas ficarão para sempre debaixo dos excertos que fazemos à alma.
O cansaço mata tudo. A raiva de não termos quem tanto amámos, a fúria de não sermos donos da nossa vontade, o orgulho de termos perdido quem mais queríamos. Só não mata as saudades e a vontade de continuar a sonhar que um dia pode mudar outra vez e libertar-nos de nós mesmos e do sofrimento, tão grande quanto involuntário, tão patético quanto verdadeiro.
Às vezes, quando a mágoa é enorme e sufoca, vegetamos em silêncio para que ela não nos coma. Fingimos que está tudo bem, rimo-nos de nós próprios perante os outros e até mesmo perante o outro que vive dentro de nós. Tornamo-nos espectadores da nossa dor. Afastamo-nos de nós, do que somos, daquilo em que acreditamos. No fundo estamos a desistir, como quem volta atrás porque tem medo do escuro, vencidos pela desilusão cansadas de esperar em casa que o mundo pare e se lembre de nós.
Mas o mundo nunca pára. Nada pára. A vida foge, os dias atropelam-se, é preciso continuar a vivê-los, mesmo com dor, mesmo com mágoa. Pelo menos a mágoa magoa, faz-nos sentir vivos.
Arde no peito e no orgulho, mas pouco a pouco vai matando a dor.
Torna-se a nossa companheira mais próxima, deixando de nos defender da tristeza que se vai consumindo como uma vela esquecida num presépio morto que uma corrente de ar ou um novo sopro de vida um dia apagará. Mas isso só é possível quando conseguirmos esquecer."